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quarta-feira, 12 de março de 2014

As semelhanças entre 1964 e 2014

04/03/2014 - Luis Nassif - GGN

Santos Vahlis, hoje em dia, é mais conhecido pelos edifícios que deixou no Rio de Janeiro e pelas festas que proporcionou nos anos 50. Foi um dos grandes construtores do bairro de Copacabana.

Venezuelano, mudou-se para o Brasil, trabalhou com a importação de gasolina e tentou se engatar nas concessões de refinarias no governo Dutra. Foi derrotado pela maior influência dos grupos cariocas já estabelecidos.

Nos anos seguintes, foi um dos financiadores da campanha do general Estillac Leal [foto] para a presidência do Clube Militar, em torno da bandeira do monopólio estatal do petróleo. Torna-se amigo de Leonel Brizola, defensor de Jango.

Provavelmente graças ao fato de ser bom cliente dos jornais, com seus anúncios imobiliários, tinha uma coluna no Correio da Manhã, cujo ghost writer era o grande Franklin de Oliveira.


Tentou adquirir o jornal “A Noite” para fortalecer a imprensa pró-Jango. Foi atropelado pelo pessoal do IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática) que, em vez de comprar o jornal, comprou sua opinião por Cr$ 5 milhões. A CPI que investigou a transação teve como integrante o deputado Ruben Paiva.


Por sua atuação, Vahlis sofreu ataques de toda ordem.


Contra ele, levantaram a história de que teria feito uma naturalização ilegal. Em 1961, em pleno inverno, foi preso e jogado nu em uma cela de cadeia, a ponto do detetive que o prendeu temer por sua vida.

Como era possível a perseguição implacável dos IPMs (Inquéritos Policial Militares), de delegados e dos Ministérios Públicos estaduais, contra aliados do próprio governo?


Esse mesmo fenômeno observou-se nos últimos anos, com os abusos cometidos no julgamento da AP 470, envolvendo não um ou dois Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), mas cinco, seis deles, endossando arbitrariedades que escandalizaram juristas conservadores.

Características da democracia

Para tentar entender o fenômeno, andei trabalhando em um estudo que pretendo apresentar no evento “50 anos da ditadura”, que ocorrerá a partir da semana que vem no Recife.

Aqui, um pequeno quadro esquemático que explica porque 2014 é tão semelhante a 1964 – embora torçamos por um desfecho diferente.


1.     A democracia é um processo permanente de inclusões sucessivas. Também é o regime de maior instabilidade (e medo) das pessoas. Nos regimes autoritários, na monarquia, nos sistemas de castas, não há ascensão vertical das pessoas – nem sua queda.


Na democracia de mercado há a instabilidade permanente, mesmo para os bem situados. Teme-se o dia seguinte, a perda do emprego, das posses, do status.

2.     Além disso, há repartição entre os poderes que abre espaço para a montagem de alianças e acordos econômicos, nos quais os grandes grupos econômicos se aliam aos grupos de mídia, através deles infuenciam os diversos poderes de Estado.


3.     Cada época de inclusão gera novas classes de incluídos que cumprem seu papel de entrar no mercado de trabalho, ganhar capacidade de consumo e, no momento seguinte, cidadania e capacidade de organização. Gera resistências tanto na classe média (medo da perda de status) quanto nos de cima (perda de influência).


Aí, cria-se uma divisão no mercado de opinião que será explorado a seguir.


O mercado de opinião

Simplificadamente, dividi o mercado de opinião em dois grupos.

O primeiro é o mercado liderado pelos Grupos de Mídia.


Por definição, é um mercado que influencia preponderantemente os setores já estabelecidos que já passaram pela fase da inclusão, do emprego, da carreira, integrando-se no mercado de opinião aos estabelecidos da fase anterior.


Por suas características, os grupos mais resistentes ao novo são os estamentos militar, jurídico, alta hierarquia pública e a alta e média classes médias – especialmente os estamentos que trabalham em grandes companhias hierarquizadas. E também a classe média profissional liberal, que depende de redes de relacionamentos.


A razão é simples. Vivem em estruturas burocráticas, hierarquizadas, nas quais cumprem uma carreira, sujeitando-se a promoções ao longo de sua vida útil. Por isso mesmo, a renovação se dá de forma muito lenta, proporcional à lentidão com que mudam os lugares nessas corporações. São os mais apegados ao status quo.


Por todas essas características – da insegurança, da carreira construída passo a passo – esses grupos são extremamente influenciados por movimentos de manada. Por segurança, querem pensar do mesmo modo que a maioria, ou que o status quo do seu grupo (ou de suas chefias).


Esse grupo pode ser denominado conceitualmente de opinião pública midiática. Ele detém o poder, a capacidade de influenciar leis, julgamentos, posições.


Mas não detém voto. Mesmo porque, quem têm votos é a maioria.


O segundo grupo é o dos novos incluídos econômicos e dos incluídos políticos mas que não tem posição de hegemonia.


Entram aí sindicatos, organizações sociais, o povão pré-organização etc, enfim, a maioria da população – especialmente em países com tão grandes diferenças de renda.


E entra o Congresso Nacional.


Os canais de informação desse público são os sindicatos, organizações sociais e os partidos políticos.


É um público que detém os votos, mas não detém poder.


O conflito entre poder e voto



Em cada período de inclusão, o partido que entende as necessidades dos novos incluídos ganha as eleições. Foi assim nos EUA com o Partido Republicano no século 19, com o Partido Democrata no século 20.

Processos de inclusão diminuem as diferenças de renda, ampliam a classe média e, quando o país se civiliza, garantem a estabilidade política – porque a maioria se torna classe média.


Mas em países culturalmente atrasados – como o Brasil – qualquer gesto em direção à inclusão sofre enormes resistências dos setores tradicionais. 


Não se trata de viés político, ideológico (no sentido mais amplo), mas de atraso mesmo, um atraso entranhado, anti-civilizatório, que atinge não apenas os hommers simpsons, mas acadêmicos conservadores, magistrados, empresários sem visão. E, especialmente, os grupos de mídia. Os de baixo temem perder status; os de cima, temem perder poder.


O partido que entende os novos movimentos colhe eleitor de baciada.


O único fator capaz de derrubá-lo são as crises econômicas (o fenômeno do populismo é o de procurar satisfazer de qualquer maneira as massas descuidando-se da economia) ou o golpe.


A reação através do golpe

Sem perspectivas eleitorais, os segmentos incluídos na chamada opinião pública midiática recorrem ao golpismo puro e simples.

Consiste em fomentar diuturnamente o discurso do ódio e levar a vendetta para o campo jurídico-policial. É o que levou à prisão de Santos Vahlis e aos abusos da AP 470.


O movimento foi bem sucedido em 1964 e consistia no seguinte:


1.     Para mobilizar a classe média, a mídia levanta fantasmas capazes de despertar medos ancestrais: o fantasma do comunismo, que destrói famílias e propriedades, do golpe que estaria sendo preparado pelo governo, da corrupção que se alastra etc.


2.     A campanha midiática cria o clima de ódio que se torna cada vez mais vociferante quanto menores são as chances de mudar o governo pela via eleitoral.


3.     Com a influência sobre o Judiciário e o Ministério Público, além de denúncias concretas, qualquer fato vira denúncia grave e, na ponta, haverá um inquérito para criminaliza-lo.


4.     Aí se entra no ponto central: as agressões, os atentados ao direito, as manipulações provocam reações entre aliados do governo. 


Qualquer reação, por mais insignificante, serve para alimentar a versão de que o governo planeja um golpe.


O ponto central do golpe consiste em fomentar reações que materializem as suspeitas de que é o governo que planeja o golpe.


É nesse ponto que o golpismo e o radicalismo de esquerda se dão as mãos.


Confiram esse vídeo aqui do Arnaldo Jabor, sobre uma proposta de um deputado obscuro do PT.


O próprio Jabor considera-o obscuro. Mas repare nas conclusões que tira. Foi buscá-las em uma nave do tempo diretamente de 1964.




O grande problema de Jango foram os aliados iludidos pela revolução cubana e pela própria campanha da mídia - que superestimava, intencionalmente, os poderes das ligas camponesas e quetais.


O histórico trabalho de Wanderley Guilherme dos Santos, em 1962, expôs de forma magistral e trágica  como se dava essa manipulação das reações.


Esse mesmo clima em relação às ligas camponesas, a mídia tentou recriar com as fantasias sobre a influências das Farcs no Brasil, sobre os dólares cubanos transportados em garrafas de rum e um sem-número de artigos de colunistas denunciando o suposto autoritarismo de Lula.


Lula e Dilma fugiram à armadilha, recorrendo ao que chamei, na época, de republicanismo ingênuo, às vezes até com um cuidado excessivo.


Não tomaram nenhuma atitude contra a mídia; não pressionaram o STF; têm sido cautelosos de maneira até exagerada; não permitiram que o PT saísse às ruas em protesto contra os abusos da AP 470.


Apesar de entender esse caminho, Jango não conseguiu segurar os seus. 


Houve radicalização intensa, conduzida por Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, pelo PCB de Luiz Carlos Prestes e por lideranças sindicais, que acabaram proporcionando o álibi de que os golpistas precisavam.


Hoje em dia não há mais a guerra fria, não há uma republiqueta encravada em um continente golpista, não há o descuido com a economia.


No entanto, há um ponto em comum nos dois períodos: o ódio que a campanha midiática provocou em diversos setores de classe média crescerá em razão inversamente proporcional ao crescimento eleitoral da oposição.

E o mote central será  a Copa do Mundo e a convicção de que o governo gastou em estádios o dinheiro da saúde.

Há uma guerra de comunicação central.

Fonte:
http://jornalggn.com.br/noticia/as-semelhancas-entre-1964-e-2014

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

A violência que usurpa a democracia

15/02/2014 - A violência usurpou a democracia
- Wanderley Guilherme dos Santos - Carta Maior

Sim, há algo de podre na política brasileira, mas enganam-se os que presumem que a podridão esteja só no Legislativo ou que de lá provenha.

Há algo de podre na política brasileira.

O discurso do ódio contaminou a cultura.

A violência física que assusta não é mais condenável do que a degradação pela palavra.

Introduzido durante os debates da Ação Penal 470, a televisão propagou Brasil a fora o escárnio como argumento, a salivação como prova irrefutável e a falta de compostura de alguns magistrados como aparte retórico.

Surpreendente a cada dia, durante todo o segundo semestre de 2013, os indiscutíveis mestres do STF, solidamente preparados, transformavam-se em arengueiros pernósticos a vociferar vitupérios em latim, em alemão e em inglês.

À língua portuguesa reservaram-se rebuscadas construções gramaticais com que degradavam de modo vil os réus em julgamento.

O valor intrínseco das evidências, muita vezes nulo, era irrelevante para o altissonante juízo que os homens de capas fúnebres proferiam.

Foi negado aos acusados a preservação última da dignidade de pessoa, a mesma que foi concedida ao assassino de Tim Lopes, Elias Maluco, ao ser descoberto: “prende, mas não esculacha”.

Com linguajar de estilo maneirista, as capas fúnebres do Supremo Tribunal Federal esculacharam quanto quiseram os réus da Ação Penal 470 perante uma audiência nacional, nela incluídos os “Elias Malucos” em liberdade.

E continuam, buscando proibir que sejam depositários da solidariedade de cidadãos e cidadãs em pleno gozo de seus direitos civis e políticos.

Não podendo oficialmente matá-los ou bani-los, apostam impor-lhes o ostracismo. 

É o discurso da vingança impotente movido a ódio.

O estímulo ao linguajar desabrido e ao julgamento apressado e irrecorrível encontrou na já virulenta blogosfera a ecologia apropriada para reprodução cancerosa.

Com a ferramenta do anonimato e a indulgência prévia a qualquer desvario, o Caim em nós desabrochou com velocidade sônica.

A filosófica vontade de morte, a definição humana de um ser para morte, revela-se menos conceitual e inocente na real inclinação para matar.

A internet veicula milhares de assassinatos virtuais e de convocatórias à destruição. Sem não mais do que o subterfúgio de códigos primários, quando muito, ações predatórias são incentivadas a qualquer título.

É total o descompasso entre avanço social e econômico do País e as toscas bandeiras eventualmente desfraldadas.

Na internet ou nas manifestações selvagens até mesmo os partidos radicais perdem importância. Não são eles que se aproveitam da turba para propaganda e crítica ao governo, é a violência irracional que se serve deles como escudo e defesa ideológica.

As antigas irrupções de quebra-quebra, de confronto entre polícia e manifestantes, e até mesmo episódios de grande magnitude, como a destruição das barcas em Niterói, no século passado, não têm parentesco próximo com o vírus do ódio contemporâneo.

Aquelas eram manifestações tópicas, de enredo conhecido e de duração previsível. Estas são projetos de vida e morte.

Tempo mal empregado o debate sobre a responsabilidade partidária dos confrontos atuais. O novo é a capacidade de mobilização a-e-trans-partidária das convocações subliminarmente homicidas.

A agressão pela palavra é companheira da agressão à palavra, à linguagem. A amputação da língua portuguesa tem sido o resultado não antecipado da linguagem de Caim.

São as frases, os verbos, as concordâncias as primeiras vítimas de todos os blocos de suposta vanguarda. Essas agressões são antigas, mas da blogosfera estão sendo trasladadas ao vocabulário jornalístico e da televisão.

Não só os textos de colunistas, repórteres e comentadores trazem conteúdo hiperbolicamente crítico, mas o vocabulário que utilizam é vulgar e de cada vez mais miserável. Não mais m..., pqp, fdap ou c......o.

Agora, intelectuais e jornalistas se esmeram  por extenso na vulgaridade da frase e na crueza dos termos.

É uma violência à palavra, ajudando a violência pela palavra, destruindo importante fonte de transmissão de cultura.

Não se aprimora o aprendizado da língua portuguesa lendo os jornais, as revistas, seus colunistas e editoriais rasteiros. Tornaram-se tão decadentes quanto o ressentimento que difundem.

Nem se discorda mais, se ofende. A violência está usurpando a democracia.

Sim, há algo de podre na política brasileira, mas enganam-se os que presumem que a podridão esteja só no Legislativo ou que de lá provenha. Para essa há remendos que asseguram a sobrevivência democrática.

Em putrefação está a cultura nacional pelo envenenamento de parte de suas fontes de elite: a cultura jurídica, o debate político e a cultura da informação. 

O péssimo é que, tal como os políticos costumam absolver seus pares, é mínima a probabilidade de que juízes ou professores ou jornalistas reconheçam a responsabilidade que lhes toca nessa podridão. São castas auto-imunes.  

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/A-violencia-usurpou-a-democracia/4/30269

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

As previsões fracassadas de 2013

20/12/2013 - O jornalismo ornitorrinco e a herança maléfica de 2013
- Wanderley Guilherme dos Santos - Carta Maior

O recorde mais espetacular do ano de 2013 foi o número de previsões fracassadas.

Dia sim, outro também, os jornalões estamparam notícias recebidas com surpresa pelo famoso mercado, que as esperava o oposto.

De boca aberta também andaram seus renomados especialistas, a inventar explicações fora da curva para os furos especialmente enormes.

Erros que, imediatamente, soterraram com pompa, circunstância e virgens anúncios de futuras tempestades.

É intrigante a permanente charlatanice com que os periódicos, diários e semanais, afagam o ego dos conservadores sem que estes se sublevem contra a falcatrua.

Ou, talvez, os conservadores desconfiem de que a realidade seja bastante diferente, mas aspiram, tal como os jornalistas e especialistas, a vê-la materializar-se conforme a aspiração.

Este parece o sonho derradeiro dos colunistas e pitonisas da oposição: obter o condão de pronunciar profecias que se auto-cumprem.

Daquelas que, uma vez proclamadas, contribuem para a realização do desastre.

Uma corrida a um banco disparada por falsa previsão de que vai quebrar pode, de fato, levar à bancarrota um estabelecimento sólido.

Mas é impossível evitar uma estupenda safra agrícola escondendo-a sob pragas e tormentas apenas verborrágicas.

Criam, contudo, uma espécie ornitorrinco de jornalismo – aquele que retrata o que lhe apeteceria acontecesse efetivamente, não o que, com modesta realidade, ocorre.

Daí a freqüente discrepância entre as manchetes e o conteúdo, ainda que este venha narrado como que sob tortura, tão tortuosa é a narrativa.

Diverso é o caso do jornalismo a soldo. Não há como perdoar àqueles que sabem o que fazem.

Omitem informações relevantes, adulteram outras, inventam terceiras.

Cada um dos desvios é serviço prestado.

Digamos que eles fabricam um tipo especial de caixa dois, recursos contabilizados como salário, quando, contudo, resultam de um efetivo domínio do fato inventado ou distorcido.

Essa cumplicidade entre fiéis ingênuos e deliberados bandoleiros que assaltam a reputação alheia, maculam o estafante trabalho de legislar ou de executar tarefas de interesse geral, enriquecendo ao longo da labuta, dificulta identificar a composição da quadrilha que, diariamente, vende engodo à população.

Estamos de acordo que as matérias impressas, tanto as assinadas quanto as editorializadas, constituem atos de ofício e aceitável evidência dos crimes assinalados, certo?

Sendo assim, uma legislação democrática, que proteja os cidadãos comuns contra os achaques e calúnias dessa quadrilha de mistificadores e inventores de escândalos, deve ser uma das preocupações de qualquer governo de origem popular.

Os antigos gregos já puniam severamente os propagadores de infâmias e em alguns casos de indução de outros a atos perversos, aplicavam a pena do ostracismo, da multa e, eventualmente, impunham até a pena de morte.

O Brasil nunca ultrapassou essa fase porque nunca esteve nela.

O jornalismo ornitorrinco e o jornalismo adversativo (aquele que acrescenta um mas, porém, todavia, contudo a toda notícia positiva) ainda são os controladores do mercado de notícias.

O mercado de notícias é o único que os conservadores não desejam livre.

Qualquer iniciativa de soltá-lo das garras oligárquicas é, ornitorrincamente, apresentada como seu oposto, o de invadir a liberdade da notícia.

Ora, o que não existe no país é justamente uma imprensa livre, plural e competitiva o suficiente para que o cidadão possa optar.

O mercado de notícias está cativo de tiranetes sem escrúpulos, de colunistas a soldo, sem mencionar o inacreditável nível de desinformação e de cultura da média das redações desses jornais.

O Judiciário, por sua vez, além da adoção do discurso de ódio, inaugurou uma etapa bastante peculiar em nosso constitucionalismo.

Dizem seus arautos que o Supremo Tribunal Federal (STF) representa a vanguarda iluminada das sociedades contemporâneas.

Ainda com mais fulgor no Brasil, entendem, em vista da podridão de que estariam acometidos os demais poderes da República.

Entre suas atribuições abrigar-se-ia a de estabelecer prazos para que o Legislativo legisle sobre matérias que ele, Judiciário, considera inadiáveis.

Isso, como todos sabem, inclusive os senhores ministros do STF, não está escrito na Constituição.

Os únicos prazos legitimamente impostos ao Legislativo, salvo engano, são aqueles hospedados por seu Regimento Interno e pelos estatutos de urgência e medidas provisórias, ambas emanadas do Poder Executivo.

De uma penada os atuais e transitórios ministros do STF ofendem o Executivo e o Legislativo.

É cautelar, em conclusão, que se observe como os conflitos por vir não deverão ser debitados à conta de um confronto direto entre o capital e o trabalho, mas entre o jornalismo ornitorrinco e o Judiciário e os demais poderes.

O ano de 2014 promete.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-jornalismo-ornitorrinco-e-a-heranca-malefica-de-2013/4/29856

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

Leia também:
- Um ano cansado e de grandes derrotas - Miguel do Rosário
- O que disse Johnny Saad para Fernando Haddad - Paulo Nogueira

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Justiça, intelectuais, PT-PSDB e suspeitas

01/12/2013 - Jean Menezes de Aguiar (*)
- blog Observatório Geral

Vive-se um descrédito da Justiça brasileira. Com o processo do “mensalão” as coisas pioraram.

Talvez os fatores mais visíveis nem sejam o Judiciário, o Direito ou seus operadores. Mas uma visão crítica e ultraqualificada, alvissareiramente vadia – no melhor dos sentidos - e descolada do pensamento conservador.

Tipicamente intelectual e à deriva, existente no lado de fora.

O Direito brasileiro pós-ditadura não é um formador de intelectuais, críticos ou pensadores.

Passou a ser um conformador de burocratas, crédulos e sisudos.

Os conceitos de transgressão, marginalidade, esquerda, pós-modernidade, sociedade assimétrica, pensamento complexo, marxismo, pensamento anárquico que costumam agradar a intelectuais e pensadores em geral, continuam a amedrontar profissionais do Direito.

Não poucos destes se mostram positivistas, legalistas, obedientes e encapsulados em seus ternos pretos, agora no modelito “mamãe quero dar”.

São os cânones da caretice, do capitalismo e do conservadorismo. Quando não da cepa do autoritarismo.

O sociólogo francês Alain Touraine [foto] esgarça o assunto:

“Eu não sou um legislador, sou um transgressor”. Pura poesia.

Um questionamento que deveria compor o menu é: o que você “quer” ser, um legalista, um ordeiro, um conservador; ou, no lado oposto, um criativo, um transgressor, um artista, um sonhador ou um liberto-libertino?

É claro que as posições não são maniqueístas ou organizadas assim. Mas o princípio é mais ou menos este.

Russel Jacoby [foto] na obra “Os últimos intelectuais” afirma que “Pensar e sonhar requerem um tempo desregulado; os intelectuais perpetuamente postados em cafés e bares ameaçam os respeitáveis cidadãos pelo esforço que colocam – ou pela aparência – em escapar da escravidão do dinheiro e do trabalho duro”.

O Direito ensinado no Brasil perdeu o sonho e a vocação. Foi estuprado pelo capitalismo personalista e portátil do concurso público.

Emprenhou-se de um consumismo provinciano, mas essencialmente ególatra.

Sem sonho não nascem intelectuais.

Relativamente ao processo do “mensalão”, há que se reparar, não foram os chamados operadores do Direito que abriram críticas ao modelo. E não se diga que elas não há.

Ives Gandra, Celso Antônio Bandeira de Mello, até o português Canotilho questionaram.

Mas é numericamente muito pouco.

A crítica massiva e pesada veio de fora. E veio com a legitimidade da intelectualidade espontânea. Revoltada.

Quem contesta a autoridade moral de Aldir Blanc [foto abaixo], Luis Nassif e Wanderley Guilherme dos Santos para desacatarem o pensamento conservador?

Há um vetor sociológico que se empenou.

O Poder Judiciário pós-Constituição de 88, decisivamente influenciado pela Constituição Cidadã conseguiu coisas.

Mas se nas décadas passadas seu pecado era não condenar poderosos, agora é escolher dentre eles quem cumpre pena.

A academia não combateu o macarthismo nos Estados Unidos. O pensamento jurídico brasileiro não está combatendo a discriminação na escolha ideológica de condenados do mensalão a serem presos.

Toda sociedade padece com ondas que agradam a uns e desagradam a outros.

Mas estudar História é saber que algumas dessas ondas terão efeitos negativos no futuro. O continuado silêncio do Supremo Tribunal Federal é ruim.

Não se pode fingir que não há críticas qualificadas do lado de fora.

Nem se diga da imprensa, que no “Dicionário de política” de Norberto Bobbio figura expressamente como Quarto Poder.

Finja-se que o que a imprensa diz e cobra não vale nada, ok.

Mas o ouvido de mercador não funciona diante de críticas equilibradas e contextualizadas. Seja do mundo jurídico, seja da intelectualidade.

Dois fatores são preocupantes.

1) as críticas ultraqualificadas de juristas de que o processo do “mensalão” se deu açodado e político.

2) a especulação sobre a candidatura de Joaquim Barbosa na direita, em oposição ao PT.

Se Barbosa sair do tribunal e confirmar a suspeita de observadores de fora, isto equivalerá a um golpe, cuja caneta terá sido a que elaborou uma sentença judicial e os perseguidos terão sido os que compuseram uma direção política com mandato.

Dificilmente a sociedade enxergaria isso.

O namorador Fernando Henrique Cardoso [foto], o único do PSDB que teria alguma chance contra Dilma, mas jamais concorreria por “chance”, afora a idade, advertiu sobre “salvadores da pátria”.

Joaquim Barbosa foi fabricado por uma imprensa do escândalo como um salvador da pátria.

A História já cansou de mostrar o engodo eficacial que foram os salvadores das pátrias.

Mas ela também mostra que grande parte do povo é uma moça bobinha que adora ser seduzida.

Ficam os críticos e intelectuais berrando já roucos em blogs e jornais; o povo pagando a conta; e a horda sorrindo com seus “salários” de 50 mil reais e meses de férias por ano.

A inteligência ainda não conseguiu reverter este quadro brasileiro.

Se Joaquim Barbosa tiver um pingo de juízo não capitula à política e desmoraliza quem o construiu.

O problema é que quando a mosca azul pica, danou, dizem.

(*) Jean Menezes de Aguiar, é jornalista e editor do blog Observatório Geral

Fonte:
http://observatoriogeral.com/2013/12/01/justica-intelectuais-pt-psdb-e-suspeitas/

Nota:
A inserção de algumas imagens adicionais, capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, elas inexistem no texto original.

sábado, 26 de outubro de 2013

Os lances de Libra e o lance de 2014

25/10/2013 - Wanderley Guilherme dos Santos (*)
- no site Carta Maior

Os conservadores quase acertaram: o exitoso leilão de Libra pode não conquistar muitos votos em 2014, como seria, segundo eles, uma das idéias subliminares da decisão do governo.

Mas tirou-lhes da boca o açúcar que o fracasso da licitação proporcionaria.

Eleições são assim mesmo, desafinadas. Em alguns casos ganha-se pouco, mas deixa-se de perder muito. Era o caso de Libra e faltou aos conservadores o domínio do fato.

Primeiro, batalharam para derrotar, no Congresso, a mudança do regime de concessão para partilha das reservas do pré-sal.

Depois previram que o edital era inteiramente hostil ao setor privado, e apontavam para a desistência de duas conhecidas predadoras dos recursos naturais do planeta como prova da denúncia.

Por fim, torceram para que não se formasse qualquer consórcio alternativo ao acordo entre a estatal brasileira, Petrobrás, e as estatais chinesas, configurando quiçá uma das “resignificações identitárias” do chavismo estatal no esquisito vocabulário do ambientalismo marineiro. Outra bola fora.

Além das estatais, participaram do conglomerado duas outras respeitáveis senhoras do comércio internacional do óleo: Shell e Total.

Para estragar definitivamente a digestão dos conservadores, o governo ainda criou, de quebra, uma empresa para controlar a exploração do campo de Libra e assegurar que sejam destinados à educação e à saúde os milhões de reais determinados em lei.

Dizem agora que as condições apresentadas pelo consórcio vencedor seriam melhores se forçado a uma concorrência, inviabilizada pelo edital.

Dá-se que a concorrência processou-se antes, tal como confessado pelo representante da Repsol, quando as demais se deram conta de que não poderiam oferecer condições melhores do que as propostas pelo consórcio vencedor. 

Ou melhor, quando perceberam que o representante do consórcio vitorioso estava preparado para cobrir propostas concorrentes.

Não foi por acaso que só depositou seu lance aos quarenta e cinco segundos do terceiro e último minuto da disputa.

Fazer pouco caso do resultado com que agora desfilam os conservadores lembra a fábula da raposa e as uvas com a adaptação de que, no caso, foram elas as uvas, bem degustadas pela raposa.

Os frutos mais suculentos do leilão histórico estão no futuro e, em 2014, mencionar o evento seja algo abstrato para o eleitor médio.

Um fracasso, contudo, carregaria um potencial de desânimo e descrédito governamental bastante superior aos votos que, ocasionalmente, a memorável vitória propicie. O que nos trás de volta ao desafinado das eleições.

Tanto quanto e por vezes mais do que o apoio conquistado pelo trabalho realizado é o que se subtrai ao que o adversário conquistaria caso contrário.

Importa menos, por exemplo, que os governos Lula-Dilma tenham construído mais universidades do que em toda a história da República, não obstante ter sido e reeleito um presidente da República professor universitário, do que impedir a oposição de alegar ausência de atenção ao ensino superior.

E o mesmo se aplica ao ensino médio, fundamental e técnico. No limite, a vitória é certa quando o adversário não tem discurso.

Sem ter o que anunciar que fariam, resta aos candidatos a candidatos da oposição enfatizar o “como” fazer.

Por enquanto tem sido o blá,blá,blá de sempre: mais eficiência e mais honestidade. Nenhum deles, todavia, por si ou por seus familiares, possui currículo impecável em qualquer dos dois tópicos.

Marina [Silva, acima] não é sombria e prá baixo só quando se apresenta e fala. Ela confunde eficiência com inação e negativismo, tal o legado que deixou no ministério que ocupou quase até o fim do governo Lula.


E passada a lua de mel com a oposição tradicional, Eduardo Campos [acima com Aécio Neves], se ainda for candidato, terá que se haver com o tratamento que lhe darão Aécio Neves e/ou José Serra. E estes entre si e com Campos. Problemão.

Eleições não se decidem apenas com votos pessoalmente conquistados, mas também com aqueles perdidos pelos outros.

Conquistar o máximo com um mínimo de perdas é o cálculo de ouro em que são mestres os grandes estadistas.

Lula, por exemplo.

Fonte:
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Os-lances-de-Libra-e-o-lance-de-2014/4/29324

(*) Wanderley Guilherme dos Santos [foto] é professor e cientista político.