Mostrando postagens com marcador Quênia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Quênia. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Quênia descobre um inacessível excesso de água

por Miriam Gathigah, da IPS


kenia Quênia descobre um inacessível excesso de água
O condado de Turkana é a região mais árida do Quênia. Segundo especialistas, a descoberta de 200 mil metros cúbicos de água na região deve beneficiar diretamente a comunidade do lugar, majoritariamente nômade. Foto: GNR8R/CC by 2.0

Nairóbi, Quênia, 19/9/2013 – Zakayo Ekeno passou décadas pastoreando gado nas áridas terras do condado queniano de Turkana, como seu pai fizera antes. Nada nesses solos liquidados pela seca lhes indicava a riqueza que escondiam. “Muitas vezes me perguntei se poderia sair algo bom desta terra de má sorte”, contou Ekeno. Turkana é o mais árido e pobre dos 47 condados do Quênia. Em 2011, quase 9,5 milhões de pessoas dessa comunidade, principalmente nômade, foram afetadas por uma severa falta de chuvas.
Assim, poucos poderiam ter sonhado que debaixo dessa terra rachada e chamuscada pelo Sol havia água suficiente para abastecer durante 70 anos um país de 41,6 milhões de habitantes como este. No dia 11 deste mês, o governo do Quênia e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) anunciaram a descoberta de reservas de aproximadamente 200 mil metros cúbicos de água doce na bacia do Lotikipi, em Turkana.
“Todos os anos perdemos gado por falta de água e pastagens. Também vivemos com medo de que outros roubem nossos animais para substituir os que perderam. Eu mesmo já fiquei ferido nesses assaltos. A água é a solução para este conflito”, pontuou Ekeno. Até agora a Organização das Nações Unidas (ONU) considera o Quênia como um país com escassez hídrica crônica, e estatísticas da Unesco mostram que 17 milhões de pessoas não têm água potável. O Quênia consome cerca de três bilhões de metros cúbicos por ano.
Embora a descoberta tenha sido recebida com emoção, especialistas em água e meio ambiente, como a cientista Judith Gicharu, alertaram que o governo queniano tem pouca capacidade e marcos legais para manejar esta sustentabilidade hídrica. “Temos a Lei da Água de 2002 e a Lei de Manejo e Coordenação Ambiental de 1999. Entretanto, elas não fornecem um contexto apropriado para a administração da água subterrânea”, indicou à IPS.
Existem disposições em marcos mais amplos, mas não abordam especificamente o uso da terra e a administração das camadas freáticas, explicou Gicharu. As decisões sobre a água subterrânea “não costumam se basear em normas sólidas. E, mesmo havendo regulamentações, raramente são cumpridas. A implantação de qualquer disposição fica comprometida pela superposição de responsabilidades de diferentes órgãos do governo que se ocupam da água e do meio ambiente”, detallhou.
No Quênia, todos os recursos hídricos pertencem ao Estado, e as entidades governamentais devem aprovar e dar permissões para o uso da água. Contudo, segundo o informe intitulado Quênia: Estudo de Caso Sobre a Governança da Água Subterrânea, publicado em 2011 pelo Banco Mundial, “não existe consciência estratégica sobre a necessidade de proteger estes recursos”.
Ikal Angelei, da organização ambientalista comunitária Amigos do Lago Turkana, alertou que, na falta de um forte contexto legislativo que possa estabelecer “a forma de explorar os recursos, quem se beneficia deles e como, é possível que esta riqueza natural não melhore significativamente a sorte do país”. A ativista acrescentou que, “tão logo foi descoberto o aquífero, e a população de Turkana já está ausente do diálogo sobre a água. O governo já fala em abastecer todo o país com a ‘nova’ água, mas, quanto dela será destinado aos habitantes do lugar?”
Esta é a segunda maior descoberta de recursos naturais em Turkana. Em março de 2012 a empresa de exploração petroleira Tullow Oil anunciou a descoberta de milhões de barris de óleo na bacia do Lokichar. “Não podemos seguir o mesmo caminho que tomou a questão do petróleo. Desde que foi descoberto em Turkana, os investidores só se interessaram em saber quando começará a ser explorado. Dos benefícios para a comunidade não falam”, destacou Angelei.
Para o economista Arthur Kimani, “o governo tem de ajudar a comunidade a entender que, além de beber a água, este recurso também pode gerar dinheiro, por exemplo, se usado para cultivar espécies comerciais”. Uma fonte do Ministério do Meio Ambiente, Água e Recursos Naturais declarou que essas críticas “não poderiam estar mais longe da verdade. De fato, a população de Turkana obterá água nas próximas duas semanas. Também nos comprometemos com o setor privado para concretizar associações que resultem economicamente viáveis para a comunidade”.
Kimani insiste em que o papel do governo é crucial para administrar o fornecimento de água subterrânea. É necessário que haja participação pública para acordar como acontecerá”, ressaltou. “Muitas empresas trabalham com uma camarilha de gente bem conectada para apresentar um sistema opaco de declaração de resultados do que foi explorado e da renda obtida”, afirmou.
“Os esquemas de renda compartilhada deveriam ser adotados de maneira aberta, para que o setor estatal tenha oportunidade de participar e se desestimule os funcionários que buscam benefícios pessoais à custa do público, sobretudo da comunidade que vive perto dos recursos naturais”, enfatizou Kimani. Por sua vez, Samuel Kimeu, diretor-executivo do escritório da Transparência Internacional no Quênia, disse à IPS que é necessário existir clareza em toda a cadeia de extração. Do contrário, “os termos das licenças irão contra o interesse público, que fica privado de seus possíveis ganhos”, ressaltou. 
Fonte: site Envolverde/IPS 
http://envolverde.com.br/ips/inter-press-service-reportagens/quenia-descobre-inacessivel-excesso-agua/

Nota da editora do Blog:  A Resolução da ONU 64/292 de julho de 2010 determina que é  direito humano Água e Saneamento. Durante a Rio+20, as nções ricas e industrializadas, principalmente Inglaterra, EUA e União Européira tentaram derrubar essa Resolução, que ainda não é cumprida.
Leia também:http:http://brasileducom.blogspot.com.br/2012/07/a-luta-pelo-direito-agua-na-rio20.html
http://brasileducom.blogspot.com.br/2010/08/agora-agua-para-todos.html

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A água ou a vida

12/09/2012 - por Protus Onyuango, da IPS (Inter Press Service)
extraído do site Envolverde

Nairóbi, Quênia – A escassez de água desata guerras interétnicas que continuam ceifando vidas no Quênia.


Mandera, na Província Nordeste do Quênia, palco de enfrentamentos pela água.
Foto: Protus Onyuango / IPS
Se nada for feito para educar as comunidades sobre como conservar os valiosos recursos hídricos, a situação se agravará ainda mais, alertam ambientalistas e especialistas governamentais.

No dia 9, 38 pessoas morreram em ataques de vingança no distrito do delta do Rio Tana, na Província Costeira, incluindo oito crianças, cinco mulheres, 16 homens civis e nove policiais.

O incidente aconteceu após anúncio do governo da realização de um exercício de desarme no delta do Tana, depois que enfrentamentos por água e pastagens deixaram mais de 80 mortos. O chefe de polícia da Província Costeira, Aggrey Adoli, informou à IPS que cerca de 500 cavaleiros do grupo étnico pokomo atacaram a aldeia de Kilelengwani, incendiaram um acampamento policial e destruíram várias estruturas. No dia 10, a região estava inacessível e os policiais tiveram que usar helicópteros para se trasladarem e deter a violência.

Isto foi em represália pelo incidente do dia 6, no qual 13 pokomos foram assassinados quando cavaleiros do grupo étnico orma atacaram a aldeia de Tarassa”, informou Adoli. No entanto, os conflitos pelos recursos não estão limitados a esta região. No dia 22 de agosto, quatro pessoas foram assassinadas em incidentes separados na aldeia de Muradellow, na Província Nordeste. A polícia disse que as mortes aconteceram em um manancial no qual pastores haviam levado seus animais. Em março, 22 pessoas foram mortas em Mandera, na mesma província, enquanto mais de 1,5 mil fugiram da violência na aldeia El Golicha, perto da fronteira com a Somália.

Ernest Munyi, funcionário da Província Noroeste e comissário assistente da polícia regional, contou à IPS que os combates são cada vez mais frequentes. “Os ataques de clãs são comuns na região, que agora é palco de confrontos mensais, desde fevereiro. Antes eram mais esporádicos”, acrescentou. Os choques acontecem entre “pastores nômades que dependem do gado para sobreviver e que lutam pela água e os poucos campos para pastar”, detalhou.

Líderes políticos, ativistas pelos direitos humanos e ambientalistas querem que o governo cuide do problema imediatamente. Mwalimu Mati, diretor-executivo da organização não ernamental Mars Group, que trabalha em temas de governança, disse à IPS que o governo deve distribuir equitativamente os recursos. “Os conflitos pelos recursos estarão conosco por um longo tempo porque as políticas governamentais que promovem o corte de árvores causam desmatamento”, explicou Mati, que também é advogado.

A escassa cobertura florestal tem como consequência uma redução das chuvas, segundo especialistas em água. Peter Mangich, diretor de Serviços de Água do Ministério de Água e Irrigação, disse à IPS que, devido aos efeitos da mudança climática, este país agora recebe apenas um quarto de suas históricas precipitações. “A média anual de chuva é de 630 milímetros, quando deveria ser quatro vezes maior. O Plano Nacional de Desenvolvimento 2002-2008 reconhece o Quênia como um país com escassez hídrica, onde a demanda excede os recursos renováveis”, afirmou o diretor. “O esgotamento de nossos recursos naturais devido às poucas precipitações e à escassa cobertura florestal, que chega a 3%, é um problema. As bacias hidrográficas não cobrem o país de maneira equitativa”, destacou.

Essa é a razão dos crescentes conflitos, segundo o geólogo e ambientalista Bernard Rop. “Houve confrontos por água e pastagens na maior parte da Província Nordeste, bem como entre os turkana, os samburu e os pokot na Província Costeira e na de Rift Valley nos últimos dez anos, causando a morte de 400 pessoas e o roubo de dez mil cabeças de gado”, disse à IPS.

E os conflitos não afetarão apenas as áreas secas. A mudança climática é real. O governo precisa adotar medidas para solucionar este problema”, ressaltou Rop.

Mati explicou que a necessidade de água levou Etiópia, Quênia, Sudão, Sudão do Sul, Tanzânia e Uganda a pedirem a revogação de um tratado de 1959, patrocinado pela Grã-Bretanha, que dá ao Egito, e em menor grau ao Sudão, direitos históricos sobre os recursos do Rio Nilo. Rop afirmou que o Quênia tem água facilmente disponível, mas que deve ser melhor aproveitada. Este país é o maior produtor de energia geotermal na África, com 290 megawatts, afirmou. Também “possui grandes quantidades de água subterrânea, que, se for aproveitada e distribuída nas áreas afetadas, acabará com o conflito”, ressaltou.

Mangich assegurou que o governo está abordando o problema. “Desde o ano passado, temos patrocinado organizações não governamentais, como a World Vision, para que cavem poços nas áreas afetadas, e os moradores possam obter água suficiente para o gado e uso doméstico”, detalhou.


Também os estimulamos a usar a água para plantar vegetais e milho, a fim de complementar a produção pecuária”, ressaltou. Porém, o diretor da Mars Group observou que é preciso exortar os pastores nômades a participarem de outras atividades econômicas mais viáveis, e sugeriu que o governo deveria promover a urbanização.

Isto permitirá a muitas pessoas viver em localidades com serviços públicos e cultivar a terra como grupo, não como indivíduos”, enfatizou Mati.

O ministro da Educação, Mutula Kilonzo, declarou à IPS que antes o governo deve implantar políticas já existentes sobre o acesso a água. “A nova Constituição tem políticas muito boas para as regiões secas, que consistem em cavar poços e promover a irrigação. Deixem que implantemos as leis sobre agricultura e os combates cessarão”, assegurou.


Envolverde/IPS

Fonte:

sexta-feira, 29 de julho de 2011

"Não se trata de mães que abandonaram seus filhos"



por Miriam Gathigah, da IPS
1336 “Não se trata de mães que abandonam seus filhos”Abdurrahman Warsameh/IPS
Uma criança do sul da Somália que sobreviveu à longa viagem até um acampamento de refugiados na capital, Mogadiscio.
Nairóbi, Quênia, 29/7/2011 – No caminho fronteiriço entre Quênia e Somália jazem os cadáveres de meninas e meninos que sucumbiram à fome e às penúrias da viagem, desde suas aldeias, arruinadas pela seca, e o território queniano. A história dessas crianças que morreram entre Dolbey, o último centro povoado no sul somaliano antes de entrar no Quênia, ainda não foi contada, afirmam trabalhadores humanitários.Ahmed Khalif trabalha para uma organização não governamental do Quênia e cruza frequentemente a fronteira entre os dois países para ajudar a população somaliana. Ele viu muitos pequenos corpos na beira do caminho. “Qualquer um que seguir essa rota pode contar terríveis histórias de cadáveres, na maioria de crianças. Suas mães também vão morrendo. Não se trata de mães desalmadas que abandonam seus filhos, mas de mães que tentam sobreviver para honrar a vida”, descreve Khalif.
Ele viu inúmeras pessoas, na maioria mulheres e crianças, tentando cruzar a fronteira. Mas quando os filhos já estão tão fracos que não podem caminhar, simplesmente caem no meio da estrada, enquanto suas mães e demais familiares meio mortos de fome seguem caminhando com a esperança de conseguir ajuda.
“É duro ver crianças à beira da morte, a pele macilenta pela desidratação extrema, os corpos demasiadamente pequenos para sua altura, os lábios ressecados. Não falam, apenas caem”. Elas “têm os olhos afundados nas órbitas, mas continuam te olhando. É muito perturbador. Alguém pode pensar que os demais não têm sentimentos por tê-las abandonado, mas estão na mesma condição. Somente a vontade de chegar ao acampamento de Dadaab os mantêm em pé”, conta Khalif.
Os que morrem dessa forma não são enterrados “Quem tem energia para fazer isso? Apenas podem continuar caminhando até o acampamento, onde encontram sepultura, se morrem ali”, acrescenta Khalif se referindo ao improvisado cemitério de Dadaab. Os menores somalianos que sobrevivem e chegam ao campo de refugiados sofreram penúrias em um grau difícil de imaginar, caminhando pelo menos dez dias sob calor intenso em terra de ninguém, infestada de hienas.
O grupo extremista Al Shabaab, presente em boa parte do sul da Somália, “continua dificultando o acesso das pessoas ao Quênia e a Dadaab, evitando que os somalianos procedentes de áreas sob seu controle cheguem a Dobley”, conta Khalif. E isto acontece apesar de Dobley estar agora em poder de forças do governo nacional, que expulsaram do povoado os rebeldes do Al Shabaab há três meses.
Então, em lugar de percorrer os 15 quilômetros entre Dobley e o Quênia, muitos precisam dar uma volta e caminhar entre quatro e nove dias para cruzar a fronteira. Este trajeto não só é mais longo, mas também mais perigoso. Grupos de criminosos roubam os escassos pertences dos refugiados e violentam as mulheres.
Dadaab, uma aldeia semiárida no leste do Quênia, na Província Nordeste, abriga mais de 380 mil pessoas e acaba de se converter no maior acampamento de refugiados do mundo. A vida ali não é fácil, sobretudo para as crianças. Diariamente chegam cerca de 1.300 somalianos e morrem quatro crianças, segundo agências da Organização das Nações Unidas (ONU), as quais asseguram que são necessários mais de US$ 300 milhões a cada seis meses para salvar a população infantil afetada pela seca.
“As crianças são muito pequenas e pesam muito pouco para sua idade. Sua condição supera a desnutrição aguda. Esta seca está liquidando avanços na luta contra a mortalidade infantil”, afirma Oliver Yambi, representante no Quênia do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). As agências da ONU estão encontrando proporções de desnutrição aguda de até 35% das crianças, caracterizada por perda extrema de peso e altura muito pequena para a idade.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu que quando a desnutrição aguda ultrapassa 15% do coletivo humano significa que foi cruzado a limite crítico ou de emergência. Porcentagens superiores apresentam um estado avançado de desnutrição aguda do qual dificilmente as crianças sairão com vida, pois têm dez vezes mais probabilidade de morrer antes de completar os cinco anos.
Segundo o Unicef, a quantidade de menores de cinco anos com desnutrição aguda aumentou na Somália, de 476 mil em janeiro, para 554.550 em julho. E suas mães não estão em melhor estado. “As crianças não são as únicas que morrem em Dadaab. A mortalidade materna é muito elevada. Estimamos que morrem pelo menos 298 mães para cada cem mil nascidos vivos.
“Os números crescem pela anemia extrema bem como pela relação entre quantidade de pacientes por enfermeira”, disse uma fonte da organização humanitária Oxfam. “Em média, há um posto sanitário para cada 1.700 refugiados, que continuam aumentando”, acrescentou. Dos refugiados no Chifre da África, 80% são mulheres.
A ONU afirmou, em comunicado divulgado no dia 27, que a fome pode causar complicações na gravidez e no parto e elevar o risco de mortes maternas e doenças do recém-nascido. Os especialistas alertam que “eliminar a desnutrição das mães pode reduzir em até um terço as deficiências de seus filhos”.
Os escritórios do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) na Somália, Etiópia, Quênia e Djibuti estão adotando medidas de emergência para distribuir suprimentos sanitários e equipamentos médicos entre as populações afetadas. “Isto ajudará a proporcionar tratamentos para salvar vidas de mães e filhos, facilitando partos mais seguros”, diz o comunicado.

Fonte: Envolverde/IPS
(IPS)