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quarta-feira, 12 de março de 2014

As semelhanças entre 1964 e 2014

04/03/2014 - Luis Nassif - GGN

Santos Vahlis, hoje em dia, é mais conhecido pelos edifícios que deixou no Rio de Janeiro e pelas festas que proporcionou nos anos 50. Foi um dos grandes construtores do bairro de Copacabana.

Venezuelano, mudou-se para o Brasil, trabalhou com a importação de gasolina e tentou se engatar nas concessões de refinarias no governo Dutra. Foi derrotado pela maior influência dos grupos cariocas já estabelecidos.

Nos anos seguintes, foi um dos financiadores da campanha do general Estillac Leal [foto] para a presidência do Clube Militar, em torno da bandeira do monopólio estatal do petróleo. Torna-se amigo de Leonel Brizola, defensor de Jango.

Provavelmente graças ao fato de ser bom cliente dos jornais, com seus anúncios imobiliários, tinha uma coluna no Correio da Manhã, cujo ghost writer era o grande Franklin de Oliveira.


Tentou adquirir o jornal “A Noite” para fortalecer a imprensa pró-Jango. Foi atropelado pelo pessoal do IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática) que, em vez de comprar o jornal, comprou sua opinião por Cr$ 5 milhões. A CPI que investigou a transação teve como integrante o deputado Ruben Paiva.


Por sua atuação, Vahlis sofreu ataques de toda ordem.


Contra ele, levantaram a história de que teria feito uma naturalização ilegal. Em 1961, em pleno inverno, foi preso e jogado nu em uma cela de cadeia, a ponto do detetive que o prendeu temer por sua vida.

Como era possível a perseguição implacável dos IPMs (Inquéritos Policial Militares), de delegados e dos Ministérios Públicos estaduais, contra aliados do próprio governo?


Esse mesmo fenômeno observou-se nos últimos anos, com os abusos cometidos no julgamento da AP 470, envolvendo não um ou dois Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), mas cinco, seis deles, endossando arbitrariedades que escandalizaram juristas conservadores.

Características da democracia

Para tentar entender o fenômeno, andei trabalhando em um estudo que pretendo apresentar no evento “50 anos da ditadura”, que ocorrerá a partir da semana que vem no Recife.

Aqui, um pequeno quadro esquemático que explica porque 2014 é tão semelhante a 1964 – embora torçamos por um desfecho diferente.


1.     A democracia é um processo permanente de inclusões sucessivas. Também é o regime de maior instabilidade (e medo) das pessoas. Nos regimes autoritários, na monarquia, nos sistemas de castas, não há ascensão vertical das pessoas – nem sua queda.


Na democracia de mercado há a instabilidade permanente, mesmo para os bem situados. Teme-se o dia seguinte, a perda do emprego, das posses, do status.

2.     Além disso, há repartição entre os poderes que abre espaço para a montagem de alianças e acordos econômicos, nos quais os grandes grupos econômicos se aliam aos grupos de mídia, através deles infuenciam os diversos poderes de Estado.


3.     Cada época de inclusão gera novas classes de incluídos que cumprem seu papel de entrar no mercado de trabalho, ganhar capacidade de consumo e, no momento seguinte, cidadania e capacidade de organização. Gera resistências tanto na classe média (medo da perda de status) quanto nos de cima (perda de influência).


Aí, cria-se uma divisão no mercado de opinião que será explorado a seguir.


O mercado de opinião

Simplificadamente, dividi o mercado de opinião em dois grupos.

O primeiro é o mercado liderado pelos Grupos de Mídia.


Por definição, é um mercado que influencia preponderantemente os setores já estabelecidos que já passaram pela fase da inclusão, do emprego, da carreira, integrando-se no mercado de opinião aos estabelecidos da fase anterior.


Por suas características, os grupos mais resistentes ao novo são os estamentos militar, jurídico, alta hierarquia pública e a alta e média classes médias – especialmente os estamentos que trabalham em grandes companhias hierarquizadas. E também a classe média profissional liberal, que depende de redes de relacionamentos.


A razão é simples. Vivem em estruturas burocráticas, hierarquizadas, nas quais cumprem uma carreira, sujeitando-se a promoções ao longo de sua vida útil. Por isso mesmo, a renovação se dá de forma muito lenta, proporcional à lentidão com que mudam os lugares nessas corporações. São os mais apegados ao status quo.


Por todas essas características – da insegurança, da carreira construída passo a passo – esses grupos são extremamente influenciados por movimentos de manada. Por segurança, querem pensar do mesmo modo que a maioria, ou que o status quo do seu grupo (ou de suas chefias).


Esse grupo pode ser denominado conceitualmente de opinião pública midiática. Ele detém o poder, a capacidade de influenciar leis, julgamentos, posições.


Mas não detém voto. Mesmo porque, quem têm votos é a maioria.


O segundo grupo é o dos novos incluídos econômicos e dos incluídos políticos mas que não tem posição de hegemonia.


Entram aí sindicatos, organizações sociais, o povão pré-organização etc, enfim, a maioria da população – especialmente em países com tão grandes diferenças de renda.


E entra o Congresso Nacional.


Os canais de informação desse público são os sindicatos, organizações sociais e os partidos políticos.


É um público que detém os votos, mas não detém poder.


O conflito entre poder e voto



Em cada período de inclusão, o partido que entende as necessidades dos novos incluídos ganha as eleições. Foi assim nos EUA com o Partido Republicano no século 19, com o Partido Democrata no século 20.

Processos de inclusão diminuem as diferenças de renda, ampliam a classe média e, quando o país se civiliza, garantem a estabilidade política – porque a maioria se torna classe média.


Mas em países culturalmente atrasados – como o Brasil – qualquer gesto em direção à inclusão sofre enormes resistências dos setores tradicionais. 


Não se trata de viés político, ideológico (no sentido mais amplo), mas de atraso mesmo, um atraso entranhado, anti-civilizatório, que atinge não apenas os hommers simpsons, mas acadêmicos conservadores, magistrados, empresários sem visão. E, especialmente, os grupos de mídia. Os de baixo temem perder status; os de cima, temem perder poder.


O partido que entende os novos movimentos colhe eleitor de baciada.


O único fator capaz de derrubá-lo são as crises econômicas (o fenômeno do populismo é o de procurar satisfazer de qualquer maneira as massas descuidando-se da economia) ou o golpe.


A reação através do golpe

Sem perspectivas eleitorais, os segmentos incluídos na chamada opinião pública midiática recorrem ao golpismo puro e simples.

Consiste em fomentar diuturnamente o discurso do ódio e levar a vendetta para o campo jurídico-policial. É o que levou à prisão de Santos Vahlis e aos abusos da AP 470.


O movimento foi bem sucedido em 1964 e consistia no seguinte:


1.     Para mobilizar a classe média, a mídia levanta fantasmas capazes de despertar medos ancestrais: o fantasma do comunismo, que destrói famílias e propriedades, do golpe que estaria sendo preparado pelo governo, da corrupção que se alastra etc.


2.     A campanha midiática cria o clima de ódio que se torna cada vez mais vociferante quanto menores são as chances de mudar o governo pela via eleitoral.


3.     Com a influência sobre o Judiciário e o Ministério Público, além de denúncias concretas, qualquer fato vira denúncia grave e, na ponta, haverá um inquérito para criminaliza-lo.


4.     Aí se entra no ponto central: as agressões, os atentados ao direito, as manipulações provocam reações entre aliados do governo. 


Qualquer reação, por mais insignificante, serve para alimentar a versão de que o governo planeja um golpe.


O ponto central do golpe consiste em fomentar reações que materializem as suspeitas de que é o governo que planeja o golpe.


É nesse ponto que o golpismo e o radicalismo de esquerda se dão as mãos.


Confiram esse vídeo aqui do Arnaldo Jabor, sobre uma proposta de um deputado obscuro do PT.


O próprio Jabor considera-o obscuro. Mas repare nas conclusões que tira. Foi buscá-las em uma nave do tempo diretamente de 1964.




O grande problema de Jango foram os aliados iludidos pela revolução cubana e pela própria campanha da mídia - que superestimava, intencionalmente, os poderes das ligas camponesas e quetais.


O histórico trabalho de Wanderley Guilherme dos Santos, em 1962, expôs de forma magistral e trágica  como se dava essa manipulação das reações.


Esse mesmo clima em relação às ligas camponesas, a mídia tentou recriar com as fantasias sobre a influências das Farcs no Brasil, sobre os dólares cubanos transportados em garrafas de rum e um sem-número de artigos de colunistas denunciando o suposto autoritarismo de Lula.


Lula e Dilma fugiram à armadilha, recorrendo ao que chamei, na época, de republicanismo ingênuo, às vezes até com um cuidado excessivo.


Não tomaram nenhuma atitude contra a mídia; não pressionaram o STF; têm sido cautelosos de maneira até exagerada; não permitiram que o PT saísse às ruas em protesto contra os abusos da AP 470.


Apesar de entender esse caminho, Jango não conseguiu segurar os seus. 


Houve radicalização intensa, conduzida por Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, pelo PCB de Luiz Carlos Prestes e por lideranças sindicais, que acabaram proporcionando o álibi de que os golpistas precisavam.


Hoje em dia não há mais a guerra fria, não há uma republiqueta encravada em um continente golpista, não há o descuido com a economia.


No entanto, há um ponto em comum nos dois períodos: o ódio que a campanha midiática provocou em diversos setores de classe média crescerá em razão inversamente proporcional ao crescimento eleitoral da oposição.

E o mote central será  a Copa do Mundo e a convicção de que o governo gastou em estádios o dinheiro da saúde.

Há uma guerra de comunicação central.

Fonte:
http://jornalggn.com.br/noticia/as-semelhancas-entre-1964-e-2014

domingo, 17 de novembro de 2013

Final de um ciclo

16/11/2013 - Com a prisão de Dirceu e Genoino, fecha-se um ciclo
- por Luis Nassif - Carta Capital

O resultado final do julgamento foi o acirramento da radicalização e o primado da vingança sobre a justiça.

A democracia se consolida nos grandes processos bem conduzidos de inclusão social e política.

Em determinados momentos da história, emergem novas forças políticas, inicialmente em estado bruto, ganhando espaço com a radicalização do discurso contra o status quo.

Em todos os tempos, as democracias passam por processos de estratificação nos quais os grupos que chegaram antes ao poder levantam um conjunto amplo de obstáculos – políticos, econômicos e legais – para impedir a ascensão dos que chegam depois.

Trava-se, então, uma luta feroz, na qual os grupos emergentes radicalizam o discurso, enfrentam as leis, as restrições e vão abrindo espaço na porrada.

É a entrada definitiva no jogo político que disciplina essas forças, enriquece a política e reduz os espaços de turbulência. Todos ganham.

Rompe-se a inércia dos partidos tradicionais, amaina-se o radicalismo dos emergentes; abre-se mais espaço para a inclusão; permite-se uma rotatividade de poder que derruba a estratificação anterior.

Sem essas lideranças, as disputas políticas iniciais enveredam para o conflito permanente, deixando o legado de nações conflagradas, como na Colômbia e no México.

Daí a importância essencial dos líderes que unificam a ação, impedem a explosão das manadas e montam estratégias factíveis de tomada do poder dentro das regras do jogo.

Acabam enfrentando duas espécies de incompreensão.

Dos adversários políticos, a desconfiança sobre suas reais intenções, manobrando o receio que toda sociedade tem em relação ao novo.

Dos aliados, a crítica contra o que chamam de “acomodamento”, a troca do sonho por ações pragmáticas.

Em seu estudo sobre Mirabeau, Ortega y Gasset define bem o perfil do estadista e de outros personagens clássicos da política: o pusilânime e o intelectual.

O estadista só tem compromisso com a mudança do Estado.

É capaz de alianças com o diabo, desde que permita a suprema ambição de mudar um país, um povo.

Já o intelectual se vale todos os argumentos do escrúpulo como álibi para a não ação.

Aliás, nada mais cômodo que o niilismo de um Chico de Oliveira, do bom mocismo de Eduardo Suplicy, dos homens que pairam acima dos conflitos, como Cristovam Buarque, dos apenas moralistas, como Pedro Simon.

Para não se exporem, não propõem nada, não se comprometem com nada, a não ser com propostas genéricas de aprovação unânime que demonstrem seus bons sentimentos, sua boa índole, sua integridade intelectual – e que quase nunca resultam em mudanças essenciais.

As mudanças no PT

É por esse prisma que deve ser analisada a atuação não apenas de Lula, mas de José Dirceu e José Genoíno.

Ambos passaram pela luta armada. Com a redemocratização, ingressaram na luta política e das ideias.

E ambos foram essenciais para a formação do novo partido e para a consolidação do mito Lula.

Na formação do PT, cada qual desempenhou função distinta.

José Genoíno [foto] sempre foi o intelectual refinado.

Durante um bom período dos anos 90 tornou-se um dos mais influentes formadores de opinião do Congresso e do país, com suas análises sobre regimento da Câmara, sobre reforma política, sobre defesa.

Já José Dirceu era o “operador”, trabalhando pragmaticamente para unificar o PT em torno de um projeto de tomada do poder e, a partir daí, de reformas.

A estratégia política do PT passava por sua institucionalização, por um movimento em direção à centro-esquerda, ocupando o espaço da socialdemocracia aberto pelo PSDB – devido à guinada neoliberal conduzida por Fernando Henrique Cardoso e à ausência de lideranças sindicais.

Não foi um desafio fácil. O PT logrou juntar em torno de si uma multiplicidade de movimentos sociais, a parte mais legítima do partido mas, ao mesmo tempo, a parte menos talhada para a tomada de poder.

Foram movimentos que surgiram à margem do jogo político, desenvolvendo-se nos desvãos da sociedade civil e sem nenhuma vontade de se sujar com a política tradicional.

Por outro lado, o papel unificador de Lula o impedia de entrar em divididas. Tinha que ser permanentemente o mediador.

O papel do operador Dirceu

Sobrava para Dirceu o papel pesado de mergulhar no barro. De um lado, com o enquadramento das diversas tendências – o que fez com mão de ferro -, dando ao PT uma homogeneidade que tirava o brilho inicial do partido, mas conferia eficiência no jogo político tradicional trazendo-o para o centro.

E o jogo político exigia muito mais do que enquadrar os grupos sociais do PT.

As barreiras eram enormes.

Passava por montar formas de financiamento eleitoral, pela aproximação com o status quo econômico, pelos pactos com os grupos que atuam na superestrutura do poder, com os operadores dos grandes interesses de Estado, pelo mercado, pelo estamento militar, pela mídia.

Dirceu foi essencial para essa transição, tanto para dentro como para fora.

Um retrato honesto dele, mostrará a liderança inconteste sobre largas faixas do PT, o único a se ombrear com Lula em influência interna e com uma visão do todo que o coloca a léguas de distância de outros pensadores do partido.

Mas também era dono de um voluntarismo até imprudente.

Lembro-me de uma conversa com ele em 1994 em Brasília, com Lula liderando as pesquisas. Falava do projeto popular do PT e do projeto de Nação das Forças Armadas, sugerindo um pacto não muito democrático.

Não por outro motivo, em diversas oportunidades Lula confessou que, se tivesse sido eleito em 1994, teria quebrado a cara.

Com o tempo, o voluntarismo foi sendo institucionalizado.

Internamente, no governo, Dirceu exercia uma pressão similar à de Sérgio Motta sobre FHC.

Queria avançar mais, queria menos cautela na política econômica, queria um projeto de industrialização.

Sua grande obra de arte política, nos subterrâneos do poder, no entanto, foi ter mapeado os elos da superestrutura que garantia FHC e inserido o PT no jogo.

Esse mapeamento resultou na viagem aos Estados Unidos, desarmando as desconfianças do Departamento de Estado, dos empresários e da mídia; a ocupação de cargos-chave no Estado, que facilitaram negociações políticas com grupos de influência.

Nada que não fosse empregado pelos partidos que já haviam chegado ao poder e que precisaram garantir a governabilidade em um presidencialismo torto como o nosso.

O veneno do excesso de poder

Assim como Sérgio Motta, no entanto, as demonstrações de excesso de poder tornaram-no alvo preferencial da mídia.

Trata-se de uma regra midiática clássica, que não foi seguida por ambos.

Quando a mídia sente alguém com superpoderes, torna-se um desafio derrubá-lo.

Com exceção de ACM e José Serra – a quem os grupos de mídia deviam favores essenciais e, em alguns casos, a própria sobrevivência -, todos os políticos que exibiram musculatura excessiva – de Fernando Collor ao próprio FHC (no período de deslumbramento), de Sérgio Motta a José Dirceu - terminaram fuzilados.

No auge do poder de Dirceu, creio que foi o Elio Gaspari quem o alertou para o excesso de exibição de influência. Foi em vão.

O reinado terminou em um episódio banal, a história dos R$ 3 mil de propina a um funcionário dos Correios.

Tratava-se de uma armação de Carlinhos Cachoeira com a revista Veja, visando desalojar o grupo de Roberto Jefferson para reabilitar os aliados de Cachoeira. (http://bit.ly/19sMvtX).

O que era claramente uma operação criminosa midiática, de repente transformou-se em um caso político, por mero problema de comunicação.

Roberto Jefferson julgou que a denúncia tinha partido do “superpoderoso” Dirceu, para amainar sua fome por cargos. E deu início ao episódio conhecido por “mensalão”.

E aí Dirceu – e o próprio Genoíno – sentiram o que significa ter chegado tardiamente ao jogo político, não dispor de “berço” e de blindagem contra as armadilhas institucionais do Judiciário e da mídia.

A cara feia da elite

É uma armadilha fatal.

Para chegar ao poder, tem que se chegar de acordo com as regras definidas por quem já é poder.

Mas, sem ter sido poder, não se tem a mesma blindagem dos poderosos “de berço”.


O episódio do “mensalão” acabou explodindo, revelando – em toda sua extensão – a hipocrisia política e jurídica brasileira, o uso seletivo das denúncias, o falso moralismo do STF (Supremo Tribunal Federal).

Nos anos 40, Nelson Rockefeller tinha um diagnóstico preciso sobre o subdesenvolvimento brasileiro: havia a necessidade de um choque de modernidade, de criação de uma classe média urbana que superasse o atraso ancestral das elites brasileiras, dominada pelo pensamento de velhos coronéis.

Uma coisa é a leitura fria dos livros de história, as análises de terceiros sobre a República Velha, sobre o jogo político dos anos 30, 40, 50. Outra, é a exposição dos vícios brasileiros em plena era da informação.

Para a historiografia brasileira, o “mensalão” é um episódio definitivo, para entender a natureza de certa elite brasileira, a maneira como o conservadorismo vai se impondo, amalgamando candidatos a reformadores de poucas décadas atrás, transformando-os em cópias do senador McCarthy.

E não apenas no discurso antissocial e na exploração primária ao anticomunismo mais tosco, mas na insensibilidade geral, de chutar adversários caídos, de executar adversários moribundos no campo de batalha, de abrir mão de qualquer gesto de grandeza.

Expõe, também, de maneira definitiva as misérias do STF.

Aliás, Lula e o PT foram punidos pela absoluta desconsideração pelo maior órgão jurídico brasileiro.

Só o desprezo pelo STF pode explicar a nomeação de magistrados do nível de Ayres Britto, Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Dias Tofolli, somando-se aos inacreditáveis Gilmar Mendes e Marco Aurélio de Mello, à fragilidade de Rosa Weber e Carmen Lucia e ao oportunismo de Celso de Mello.

O resultado final do julgamento foi o acirramento da radicalização, o primado da vingança sobre a justiça, a exposição do deslumbramento oportunista de Ministros sem respeito pelo cargo.

No plano político, sedimentam no PT a mística de Genoíno e Dirceu. Se deixam ou não o jogo político, não se sabe.

Mas, com sua prisão, fecha-se um ciclo que levou um partido de base ao poder, institucionalizou um novo jogo político e, sem o radicalismo dos sonhadores sem compromissos, permitiu mudar a face social do país.

Não logrou criar um projeto de Nação, como pensava Dirceu. Mas deixou sua contribuição para a luta civilizatória nacional.

A democracia brasileira deve muito a ambos.

Fonte:
http://www.cartacapital.com.br/politica/com-a-prisao-de-dirceu-e-genoino-fecha-se-um-ciclo-2395.html

Nota:
A inserção das imagens, quase todas capturadas do Google Images, são de nossa responsabilidade, pois inexistem no texto original.

sábado, 9 de novembro de 2013

A vitória do Bolsa Família

02/07/2012 - Atualizado em 03/08/2012
- Luis Nassif on line
Coluna Econômica - GGN


Ao completar 10 anos recentemente o Programa Bolsa Família apresenta-se como a mais bem sucedida das iniciativas sociais do governo Lula, não importa o que digam adversários e porta-vozes abrigados na mídia empresarial conservadora.

Essa é a razão que nos leva a publicar o texto abaixo - de um ano e pouco atrás -, cujas linhas revelam-se ainda atuais e cada vez mais merecedoras de conhecimento e reflexão. (Blog Educom)
    

Se houve um vitorioso na Conferência Rio+20 foram as políticas de transferência de rendas do país e, entre elas, especificamente o Bolsa Família.

A agenda da pobreza acabou indo para o centro do documento final da conferência.

E em todo lugar em que se discutia o tema, a experiência brasileira era apontada como a mais bem sucedida, em vários aspectos: efetividade (não gera dependência), os beneficiários trabalham, há o emponderamento das mulheres, melhor frequência escolar e desempenho das crianças.

Hoje em dia, há pelos menos duas delegações internacionais por semana visitando o MDS (Ministério do Desenvolvimento Social), segundo informa a Ministra Tereza Campello, para saber mais detalhes da experiência.

Com 9 anos de vida e 13,5 milhões de famílias atendidas, com riqueza de séries históricas, estatísticas e avaliações, o BF conseguiu desmentir várias lendas urbanas:

Lenda 1 – o BF criará preguiçosos acomodados.
Os levantamentos comprovam que maioria absoluta dos adultos beneficiados trabalha na formalidade e na informalidade.

Lenda 2 – as beneficiárias tratarão de ter mais filhos para receber mais auxílio.
O último censo comprovou redução geral da natalidade no país, mais ainda no nordeste, mais ainda entre os beneficiários do BF.

Lenda 3 – um mero assistencialismo sem desdobramentos.
Nos estudos com gestantes, as que recebem BF frequentam em 50% a mais o pré-natal; as crianças nascem com mais peso e altura; houve redução da mortalidade materna e infantil. Há maior frequência das crianças às escolas.

Agora, através do Programa Brasil Carinhoso, se entra no foco do foco, as famílias mais miseráveis com crianças de 0 a 6 anos. No total, 2,7 milhões de crianças.

Em 9 anos, atendendo 13,5 milhões de família, o BF consegue uma avaliação refinada e de segurança para todos os parceiros.

Com Brasil Carinhoso pretende-se chegar a 2,7 milhões de crianças, em famílias pobres com filhos entre 0 e 6 anos de idade.

A grande preocupação da presidente, explica Tereza Campello [foto], é que essas crianças não podem esperar: qualquer impacto da pobreza sobre sua formação, qualquer problema nutricional as afetará por toda a vida

Essas famílias representam 40% dos extremamente pobres do país. Primeiro, se levantará sua renda atual. O Brasil Carinhoso complementará até atingir R$ 70,00 per capita por mês.

Hoje em dia, não há um técnico de renome que tenha ressalvas maiores ao Bolsa Família. As críticas estão concentradas em colunistas sem conhecimento maior de metodologia de políticas sociais, de estatísticas.

No início do governo Lula, havia duas vertentes de discussão sobre políticas sociais.

Uma, a do universalismo inconsequente, a do distributivismo sem metodologia – cujo representante maior era Frei Betto e seu Fome Zero.

A outra, um modelo metodologicamente sofisticado, tem como figura central (na parte de focalização) o economista Ricardo Paes de Barros [foto].

Prevaleceu um misto do modelo, com as estatísticas sendo utilizadas para focalizar melhor os benefícios. Foi esse modelo que acabou consagrando universalmente o BF.

As críticas desinformadas - 1
Conhecido por sua militância conservadora, o colunista Merval Pereira [foto] (o Globo e CBN) apresentou como contraponto ao Bolsa Familia o que ele considerou uma proposta alternativa de esquerda.

“O Fome Zero/Bolsa-Família, do jeito que estava montado pela turma do Frei Betto, era um projeto de reforma estrutural, da estrutura do Estado. Frei Betto queria fazer comissões regionais sem políticos, para distribuição do Bolsa-Família, e a partir daí fazer educação popular”.

As críticas desinformadas - 2
Continua o revolucionário Merval:
“ Era um projeto muito mais de esquerda, muito mais voltado para mudanças estruturais da sociedade. O Bolsa-Família hoje é um programa para manter a dominação do governo sobre esse povo necessitado. Patrus transformou-o num instrumento político espetacular, que foi o começo da força do lulismo”.

O conceito de educação popular significa fora da rede oficial, levando mensagens populares aos alunos.

As críticas desinformadas – 3
O que Merval descreve, em seu discurso, é modelo similar ao do MST e sua universidade popular. 

A troco de quê um comentarista claramente conservador de repente se põe a defender modelos revolucionários que levem a “mudanças estruturais na sociedade”?

Primeiro, a necessidade de ser negativo em relação a tudo. Segundo, o despreparo para tratar com temas técnicos. 

Empunha o primeiro argumento que lhe vem à mão, mesmo sendo contra tudo o que defende.

As críticas desinformadas – 4
Quando foi lançado, o Fome Zero nem podia ser tratado como programa. Era um amontoado de iniciativas caóticas cerca de slogans vazios.

O objetivo seria mobilizar a sociedade para receber ajuda, sem nenhuma preocupação com logística de distribuição, com levantamentos estatísticos. Não havia a preocupação mínima de integrar o auxílio com educação, meio social. 

Não gerou sequer um documento expondo qualquer filosofia.

As críticas desinformadas – 5
Todo defeito que Merval vê na BF era constitutivo do tal Fome Zero.


E as principais críticas ao Fome Zero vinham justamente dos economistas “focalistas”, aqueles que em geral são mais acatados nos círculos políticos que Merval frequenta.

Na época, defendia-se a focalização como maneira de focar os gastos nos mais necessitados, evitando desperdícios. A crítica contrária era a dos universalistas – que queriam políticas sociais para todos.

As críticas desinformadas – 6
O que o BF fez foi incorporar toda a ciência dos indicadores dos focalistas, montar sistemas exemplares de acompanhamento e avaliação, e universalizar o atendimento a todos os miseráveis. 

É essa visão, amarrada a metodologias de primeiro nível, que a transformou em modelo universal de políticas sociais, perseguido por países africanos, asiáticos, por ONGs europeias e norte-americanas.

Para consultas veja também:
- Fecundidade por Grandes Regiões e Faixas de Renda Domiciliar nos Censos Demográficos 2000 e 2010
- Considerações sobre possíveis impactos das ações do Brasil Carinhoso sobre a fecundidade
- Taxas de mortalidade infantil por região e faixa de renda domiciliar per capita entre os censos de 2000 e 2010

Fonte:
http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/a-vitoria-do-bolsa-familia


Especial sobre o Programa Brasil Carinhoso
Benefício reduz em 62% a extrema pobreza na primeira infância

Pagamento do Brasil Carinhoso começou em junho [2012], chegando a 1,97 milhão de famílias

O dia 18 de junho representa um marco na luta contra a pobreza no Brasil. A partir desse dia, 1,97 milhão de famílias começaram a receber o novo benefício do programa Bolsa Família, concebido para acabar com a extrema pobreza na primeira infância.

O novo benefício é calculado de modo a garantir renda mensal per capita (computados os recursos próprios e os benefícios) acima da linha de extrema pobreza de R$ 70 para todas as famílias do programa, com filhos de 0 a 6 anos, que permaneciam na extrema pobreza mesmo depois de receber as transferências tradicionais do Bolsa Família.

Estimativas feitas a partir do Censo 2010 indicam que, com o novo benefício, a extrema pobreza das crianças de 0 a 6 anos deve cair 62%. A extrema pobreza em todas as faixas etárias deve cair quase 40%, já que o benefício alcança não apenas as crianças, mas todas as pessoas de suas famílias.

Essa novidade faz parte da Ação Brasil Carinhoso (ABC), lançada em maio pela presidenta Dilma Rousseff, no âmbito do Plano Brasil Sem Miséria (BSM). O diagnóstico que embasou o BSM mostra que crianças e adolescentes de até 15 anos representam 40% da população que vive na extrema pobreza.

“Nesse universo (0 a 15 anos), o foco na primeira infância era necessário e urgente porque essa é a fase mais decisiva para o crescimento e desenvolvimento do ser humano, e passa muito rápido, mas suas marcas permanecem ao longo da vida”, ressalta o secretário nacional de Renda de Cidadania, Luís Henrique Paiva.

Valores e famílias beneficiadas – O novo benefício não possui valor máximo. Seu objetivo é fazer com que todas as famílias beneficiárias com integrantes na primeira infância superem a extrema pobreza, mesmo as mais numerosas – que estão se tornando cada vez menos comuns. A taxa média de fecundidade no Brasil está abaixo da necessária para a reposição da população. Entre as famílias do programa, a média de filhos equivale à taxa de reposição, e não há qualquer indício de reversão dessa tendência.

Para 1,97 milhão de famílias que começam a receber o novo benefício, o valor médio do Bolsa Família passará de R$ 153 para R$ 237. Cerca de 90% dessas famílias receberão até R$ 352 e 99% receberão até R$ 532. Apenas 16 mil famílias receberão valor maior que esse, o que representa 0,1% dos 13,5 milhões de famílias do programa. São justamente as famílias maiores, que mais precisam de apoio para que as crianças possam se alimentar bem, estudar e crescer saudáveis.

O benefício médio para todas as famílias do programa aumentou de R$ 120 para R$ 134.

Impactos do Bolsa Família

Estudos comparativos mostram que a focalização do Bolsa Família nos mais pobres está entre as melhores para programas internacionais do mesmo tipo. Esses estudos também apontam que a extrema pobreza seria um terço maior, não fossem as transferências do programa.


A segunda rodada de avaliação de impacto do programa Bolsa Família registrou impactos positivos na educação das crianças beneficiárias (tanto na frequência escolar quanto na própria taxa de aprovação); na saúde, tanto das crianças (aumento da vacinação em dia e do aleitamento materno) quanto das gestantes (aumento do número de consultas de pré-natal); e na autonomia das mulheres (são as mães, sempre que possível, que recebem o benefício).

Tudo isso resulta de um programa com orçamento de R$ 20 bilhões em 2012, que representa menos de 0,5% do PIB, o que o coloca como solução extremamente eficiente no combate à extrema pobreza.

O programa Bolsa Família, que se tornou referência internacional no combate à pobreza, está entre os mais avaliados e auditados no governo federal. Batimentos e checagens de informações são feitos anualmente.

A lista de beneficiários é pública e está disponível em: 

Para evitar exploração indevida das informações sobre as famílias, a legislação do programa define que seus demais dados só podem ser repassados a terceiros para fins de implantação de políticas públicas ou de realização de estudos e pesquisas.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O procurador que se vendeu à mídia

01/11/2013 - por Miguel do Rosário
- em seu blog O Cafezinho


Essa análise do Nassif, com experiência nesses embates sujos entre Ministério Público, barões do submundo financeiro e político, e mídia, repletos de acordos secretos e assassinatos de reputação, é uma aula magna, embora sombria, de como política e justiça se relacionam no Brasil.


01/11/2013 - O procurador que apostou na blindagem errada
- Por Luis Nassif, no GGN.






A enrascada em que se meteu o procurador da República Rodrigo De Grandis [foto] se deve à sua aposta na blindagem errada:

julgou que o PSDB 
fosse um todo homogêneo e não se deu conta de que a blindagem da mídia beneficiava exclusivamente o grupo ligado ao ex-governador José Serra.

A primeira prova de fogo de De Grandis foi a Operação Satiagraha.

Nela, os principais atores – juiz Fausto De Sanctis e o delegado Protógenes Queiroz – [foto] foram alvos de uma campanha implacável – da mídia, como um todo, reforçada pelo Ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes.

De Sanctis e Protógenes mostraram estrutura psicológica para resistir ao massacre a que foram submetidos. De Grandis encolheu-se, assustou-se.

Quando a Satiagraha recrudesceu, seus parceiros apontavam para seu pouco entusiasmo, o desagrado de ser interrompido em alguma festa para tomar alguma medida urgente, a demora em responder a algumas questões, nada que o comprometesse mas que já demonstrava seu desconforto de enfrentar empreitada tão trabalhosa – que, para procuradores mais vocacionados, poderia ser o desafio da vida.

Definitivamente, De Grandis [foto acima] não tinha a estrutura psicológica e a vocação dos que se consagraram no combate ao crime organizado, como os procuradores Vladimir Aras, Raquel Branquinho, Luiz Francisco, Celso Três, Janice Ascari e Ana Lúcia Amaral – firmes e determinados, alguns até o exagero, como várias vezes critiquei.

O convite inacreditável a Mainardi
Na primeira vez que foi alvo de ataques, De Grandis arriou.

Ocorreu quando o colunista de Veja, Diogo Mainardi [foto, D com De Grandis], avançou além da prudência e anunciou que entregaria pessoalmente ao juiz da Operação Chacal (na qual Dantas era acusado de grampear adversários e jornalistas) o relatório da Itália sobre as escutas da Telecom Italia.

Titular do caso, a procuradora Anamara Osório [ladeada por Thiago Lacerda e Rodrigo Janot] reagiu e publicou nota no site do Ministério Público Federal de São Paulo alertando que se tratava de um jogo de Dantas para contaminar o inquérito.

Sem noção, Mainardi partiu para ataques destrambelhados contra os procuradores. 

Depois, caiu a ficha e entrou em pânico.

Dias depois, foi recebido por De Grandis, através da intermediação de um colega de faculdade ligado à ex-vereadora Soninha [Francine, foto] – do grupo de Serra.

Foi um encontro surpreendente. Numa ponta, um colunista assustado – conforme algumas testemunhas do encontro -, quase em pânico, querendo desfazer a má imagem perante os procuradores. Na outra ponta um procurador assustado, querendo desfazer a má imagem junto à mídia.

Foi provavelmente ali que De Grandis sentiu a oportunidade de se aproximar dos detratores e proteger-se do fogo futuro.

Convidou Mainardi [foto] para palestrar em um encontro social de procuradores, avalizando – perante a classe – a conduta de um dos principais suspeitos de atuação pró-Dantas.

Só não ocorreu o encontro por falta de agenda de Mainardi.

As mudanças na atuação
A partir daquele episódio, surgem os sinais mais nítidos da aproximação de De Grandis com o grupo Serra.

Quando a Operação Satiagraha foi anulada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), De Grandis recorreu, como não poderia deixar de fazer, mas chamou a atenção sua indiferença contra uma medida que comprometia o que procuradores mais vocacionados considerariam o trabalho de sua vida.

Tempos depois, recusou pedido da Polícia Federal para indiciar o vereador Andrea Matarazzo [foto] – também do grupo Serra. Devolveu o inquérito solicitando mais informações para tomar sua posição.

Poderia ser apenas rigor técnico, não fossem os fatos posteriores.

Foi apanhado no contrapé quando a revista IstoÉ mencionou os pedidos de procuradores suíços para atuar contra suspeitos do caso Alstom – dentre os quais José Ramos, figura-chave da história.

Alegou ter esquecido o pedido em uma pasta errada. 

Agora, a Folha informa que o próprio Ministério da Justiça enviou três cobranças, os procuradores paulistas também o questionaram, e nada foi feito.

O erro de avaliação
Há vários pontos a explicar seu comportamento.

O primeiro, o da análise incorreta do benefício-risco.

A Satiagraha revelou, em sua amplitude, o risco de atuar contra pessoas próximas a Serra. Se fosse a favor, haveria blindagem. 

E a comprovação foi o próprio comportamento do ex-Procurador Geral da República Antônio Fernando de Souza [foto].

Ele retirou da AP 470 o principal financiador do mensalão – as empresas de telefonia controladas por Dantas -, escondendo dados levantados pelo inquérito da Polícia Federal.

Foi premiado com contratos milionários da Brasil Telecom, e continuou vivendo vida tranquila.

Antes disso, o mesmo Antônio Fernando anulou a Operação Banestado, em uma atitude escandalosa que não mereceu uma reação sequer da corporação dos procuradores, menos ainda da mídia.

Depois, o ativismo político de Roberto Gurgel [foto], comprometendo a imagem de isenção da corporação e garantindo aos inimigos, a forca, aos aliados, a gaveta.

Com tais exemplos, De Grandis deve ter apostado que, ficando longe dos esquemas tucanos, seria poupado pela mídia.

A falta de informação lhe custou caro.

A blindagem da mídia abrange exclusivamente o esquema Serra – uma estrutura complexa que passa pelo banqueiro Daniel Dantas [foto], por Verônica Serra, por lugares-tenentes como Andrea Matarazzo, Gesner de Oliveira, Mauro Ricardo, Hubert Alqueres (e seu primo José Luiz), antes deles, por Ricardo Sérgio, Vladimir Riolli, pelos lugares-tenentes que levou ao Ministério da Saúde, pelos esquemas de arapongagem.

Não entram na blindagem outros grupos tucanos, como o do governador paulista Geraldo Alckmin ou os mineiros de Aécio.

Pelo contrário, não poucas vezes são alvos de fogo amigo.

Ao não se dar conta dessas nuances, De Grandis se expôs.

Agora ficou sob fogo cruzado do PT e no grupo de Serra.

O PT, para atingir o PSDB; o grupo de Serra para fornecer mais elementos para Dantas anular a Satiagraha no Supremo Tribunal Federal.

O primeiro grupo ataca De Grandis da Operação Alstom; o segundo, o De Grandis que não mais existia, da Satiagraha.

O anacronismo da gestão Gurgel
Some-se a tudo isso o anacronismo burocrático da gestão Gurgel.

O MPF padece do mesmo vício do jornalismo: as tarefas principais, a linha de frente das investigações são entregues a procuradores ou repórteres novatos. Quando ganham experiência, procuradores são promovidos e limitam-se a dar pareceres; e repórteres tornam-se editores.

O burocratismo de Gurgel [foto] não criou nenhuma estrutura intermediária, com procuradores mais experientes coordenando, orientando e fiscalizando a atuação da linha de frente.


Agora, o novo PGR, Rodrigo Janot [foto], montou essa estrutura intermediária, nomeando procuradores experientes para essa função.

O episódio traz inúmeras lições.
A principal delas são os efeitos deletérios sobre o trabalho dos procuradores, quando submetidos ao jogo de interesses da mídia.

Recentemente, o MPF de São Paulo montou um seminário apenas com representantes da velha mídia, para falar das relações entre eles.

Houve loas à liberdade de imprensa, ao apoio que a mídia dá a escândalos mesmo que não devidamente apurados pelo MPF, a celebração da amizade – que já feriu tantos direitos individuais, pelo hábito da escandalização.

Em nenhum momento entrou-se nos temas centrais: a influência deletéria dos interesses econômicos na cobertura jornalística; a maneira como essa submissão à mídia inibe ou pauta o trabalho de procuradores; o novo papel das redes sociais, como freio e contrapeso aos interesses corporativos.

Quem sabe, comecem a acordar para os novos tempos.

Fonte:
http://www.ocafezinho.com/2013/11/01/o-procurador-que-se-vendeu-a-midia/