quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A Um Herói de Purpurina

22/11/2012 - Antonio Fernando Araujo

É difícil tratar com ironias uma cerimônia do porte da posse de um presidente da mais alta instituição jurídica do país sem também levar em conta que nesse universo de eventos desconcertantes há pouco mais de dois anos nossa Família GAFE da Imprensa (Globo/Abril/Folha/Estadão) protagonizava sua desejada assunção de Marina Silva à presidência da república.

Não que Joaquim Barbosa tenha se tornado uma Marina Silva de toga e, muito menos pelo fato das iniciais do seu nome coincidirem com as de Jader Barbalho e que apenas isso nos autoriza a fazer de conta que a moeda de troca em qualquer dos casos tenha sido a mesma, justamente aquela que também foi utilizada para transformar Fernando Collor de Mello de um exótico "caçador de marajás" em Presidente da República e daí no maior patife que o Planalto Central, até então já vira florescer.

Apesar disso e se for esse o caso, pois nada nos impede, vamos então apostar que algumas capas de revistas e meia-dúzia de manchetes bem postadas no topo das suas páginas sejam as varinhas de condão que ainda conservam o mesmo fascínio que não só encantou aquele hóspede da "Casa da Dinda" e comprou o silêncio venal do senador do Pará quanto exaltou o moralismo desajeitado da ex-seringueira do Acre e agora se dispõe a borrifar a purpurina negra da toga sobre o verde-amarelo da faixa presidencial que o agora, tornado "caçador de corruptos" e nossa Família GAFE, tornada agora madrinha, já sonham exibir-se em janeiro de 2015, numa espécie de maquinação antecipada com ares de patriotismo de oportunidade.

Se assim for, a ironia que se pretende aqui não é nem de longe a advinda do fato dessa grande mídia empresarial já, há algum tempo, ter percebido o quanto sai barato produzir um herói a cada semana, mas a jubilosa constatação de que, ao menos nesse aspecto e talvez até de forma idêntica ainda que fortuita, não é assim que a grande massa costuma forjar seus verdadeiros heróis.

Por seus veículos, grande massa e grande mídia, tão perto de uma legítima e profunda identidade com a parcela maior da população brasileira se encontra a primeira quanto tão distante e desassociada dela se encastela a outra.

Embora saibamos que em qualquer dos casos seus custos possam ser similares, seus significados contudo, em muito ultrapassam o preço de uma bala disparada contra o peito de Getúlio, a vida de algumas centenas de jovens brasileiros dependurados e torturados em "paus-de-araras", de outros tantos exilados como o foi José Dirceu, ou simplesmente mortos na luta heroica contra o fascismo tupiniquim, não importando aqui se, em um rosário de ironias, nos for permitido incluir - e apenas como um símbolo -, a perda de um dedo mindinho da mão esquerda, nem que seja tão somente para que boa parte dos ideais daquela juventude não se perca assim de todo, vazada pelos ralos de uma democracia caricata que se instalou no país pós-ditadura civil-militar.

No entanto, de uma coisa estamos certos, por mais irônico que tudo possa parecer. Nesses cenários não há sarcasmo algum que se mantenha como tal.



Será simplesmente insustentável que floresça a crença de que o barro que se utilizou para moldar a História heroica de toda uma geração tenha sido o mesmo empregado pelas caducas algumas e decadentes outras, Redações - ainda que conservem o glamour e as garras afiadas -, da nossa Imprensa GAFE quando ela se dispõe a produzir lendas e mais lendas, todas elas, desafortunadamente calcadas sobre seus tristes heróis de purpurina.